sábado, 5 de julho de 2008

Louco é quem me diz parte II : A Arte da Loucura



Compareci ao fechamento da Mostra de Arte Insensata, que ocorreu do dia 28 ao 31 de maio, e apenas um dia foi suficiente para confirmar a minha suspeita de que uma pitada de loucura traz mais Arte para a vida. Reunindo os usuários e artistas do serviço de saúde mental, com o objetivo de apresentar seus trabalhos e promover a integração social dos mesmos, o evento comemorou o dia da Luta Antimanicomial (18 de maio) com palestras, oficinas e exposições, fechando com chave de ouro com shows do Trem Tan Tan e Tom Zé.

A crise institucional da Divisão de Saúde Mental (DINSAM) dos anos 60 fez com que hoje os movimentos para substituir os manicômios por centros de convivência se concretizassem, deslocando o doente mental de um ambiente angustiante para um espaço de abertura para criação, para a Arte, para o trabalho, por meio dos quais vão expressando e escoando seus conflitos, superando traumas, recuperando a auto-estima, desenvolvendo o auto-conhecimento e aos poucos reconquistando uma identidade, um lugar.

Foi o primeiro ano de um evento que representou uma conquista para todos os funcionários, psicólogos e, principalmente, para os portadores de sofrimento mental, que, ao longo dos anos, vêem lutando para vencer o preconceito que ainda os impede de serem aceitos tanto no âmbito da cultura quanto na sociedade. Para muita gente, louco ainda é uma figura medonha, que merece viver isolado num quarto escuro. Mas as pessoas que têm essa opinião ainda não pararam para pensar que a linha entre a loucura e a sanidade é absurdamente tênue. Prova disto é que muitos usuários diagnosticados com esquizofrenia acreditam sofrerem apenas de uma “depressão profunda” , que na verdade foi a causa do desenvolvimento da doença. Por sua vez, sabemos que decepções, frustrações e perdas, por exemplo, levam a depressão, e aí é que está: eu e você estamos sujeitos a tais causas a todo tempo, ou seja, vivemos à beira da loucura.

É preciso perceber que o que nos separa de um esquizofrênico é apenas a capacidade de sair de determinadas situações que nós ainda possuímos e que eles, por diversos motivos, a perderam, ou no momento de desespero se apoiaram em pessoas ou substâncias não confiáveis. A arte na vida destas pessoas é a tábua de salvação que eles precisaram naquele momento em que o barco furou, e que ainda precisam, para reconstruir uma nova embarcação e remarem por contra própria. E confesso: para mim a arte representa a mesma coisa, quando não quero afogar em mágoas, quando me sinto sufocada pelos meus próprios fantasmas e pela hipocrisia que assola este nosso mundo “louco”.


por Bárbara Rodrigues
fotos: Tom Zé - Trem Tan Tan

>Confira o trabalho do Trem Tan Tan: http://www.myspace.com/tremtantan
e o vídeo de Tom Zé, na Mostra, confundindo para esclarecer:
http://br.youtube.com/watch?v=xtgPds4xSfs